terça-feira, 25 de maio de 2010

Soneto 1

Este é meu 1º soneto. Escrevo, com ironia, sobre o poeta de palavras que é "um tranqueira" como ser humano, mas lava as mãos pois, afinal, tem a desculpa: "mas versos lindos faço feito Olavo".

Se tu pensas que sou sempre bom moço
E que minhas palavras são poesia,
Minha fala indigesta dá azia,
Sou pior do que carne de pescoço.

E se passa um pouco a hora do almoço
Eu reclamo demais, em demasia;
E se a alcatra não estiver macia
E mais dura de roer do que um osso,

Tu verás o que é ser um cara chato,
Um angu de caroço, um bicho bravo,
Que não vale a comida do seu prato.

Mas versos lindos faço feito Olavo!
Se na vida eu sou sempre ingrato,
Qual Pilatos, as minhas mãos eu lavo...

segunda-feira, 17 de maio de 2010

A Um Poeta

Olavo Bilac é um dos poetas mais criticados por lutar pela rima, ritmo, pela perfeição do verso. Muita gente diz que seus poemas são frios, e que não emocionam. Discordo. "A Um Poeta" fala de se trabalhar arduamente num poema, mas que ele deve soar simples ao leitor. Mais uma aula do mestre.

Longe do estéril turbilhão da rua,
Beneditino escreve! No aconchego
Do claustro, na paciência e no sossego
Trabalha e teima, e lima , e sofre, e sua!

Mas que na forma se disfarce o emprego
Do esforço; E a trama viva se construa
De tal modo, que a imagem fique nua,
Rica mas sóbria, como um templo grego.

Não se mostre na fábrica o suplício
Do mestre. E, natural, o efeito agrade,
Sem lembrar os andaimes do edifício:

Porque a Beleza, gêmea da verdade,
Arte pura, inimiga do artifício,
É a força e a graça na simplicidade.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Buscando a Cristo

Gregório de Matos, mais conhecido como "Boca Maldita", aqui mostra-se "Boca Bendita". Este é um dos sonetos mais comoventes que já li. A beleza da forma aliada ao "espírito" lírico.

A vós correndo vou, braços sagrados,
Nessa cruz sacrossanta descobertos
Que, para receber-me, estais abertos,
E, por não castigar-me, estais cravados.

A vós, divinos olhos, eclipsados
De tanto sangue e lágrimas abertos,
Pois, para perdoar-me, estais despertos,
E, por não condenar-me, estais fechados.

A vós, pregados pés, por não deixar-me,
A vós, sangue vertido, para ungir-me,
A vós, cabeça baixa, p'ra chamar-me

A vós, lado patente, quero unir-me,
A vós, cravos preciosos, quero atar-me,
Para ficar unido, atado e firme.

domingo, 2 de maio de 2010

Sonetos

Apreciando poesia, não dá pra deixar de perceber o espaço que os grandes poetas deram à forma soneto, composição poética de catorze versos, em geral rimados e dispostos em quatro estrofes (dois quartetos e dois tercetos), com versos de dez sílabas, até à última tônica, em sua maioria (modelo levado à perfeição por Camões). Note o 1º, 4º,5º e 8º versos terminados em "er", o 2º, 3º, 6º e 7º em "ente", o 9º, o 11º e 13º em "ade" e o 10°, 12º e 14º terminados em "or". Observe também os decassílabos, contados da primeira sílaba até à última tônica:

A-mor-é- fo-go-quear-de-sem -se-ver/
É-fe-ri-da-que-dói-e-não-se-sen(última tônica)-te

Soneto 5 (Camões)

Amor é um fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?